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CIDADE & REGIÃO
10/04/2012
Confira a entrevista com o palestrante convidado do 10° Fórum de Saneamento e Meio Ambiente
“Nossa tarefa no século 21 é parar de fazer embalagens e produtos que têm de ser destruídos”
Dan Moche Schneider, engenheiro, especialista em Gestão Ambiental, mestre em Saúde Ambiental (USP) e Consultor de Resíduos Sólidos do Ministério do Meio Ambiente.
Em sua visão, quais são os pontos fracos da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) e como lidar com eles?
Depois de mais de vinte danos de luta por esse marco regulatório, a Política Nacional de Resíduos Sólidos, assim como a Lei Nacional de Saneamento Básico e a Lei de Consórcios Públicos, constitui um marco na história recente das políticas ambientais e de saneamento brasileiro e passa a nortear todas as ações de gestão e manejo de resíduos sólidos.
A fragilidade da PNRS é o não desenvolvimento de estratégias para a não geração de resíduos, o aspecto prioritário da gestão de resíduos. Segundo o Art. 9º desta lei: “Na gestão e gerenciamento de resíduos sólidos, deve ser observada a seguinte ordem de prioridade: não geração, redução, reutilização, reciclagem, tratamento dos resíduos sólidos e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos”.
A não geração é com razão, segundo a PNRS, a prioridade na gestão e gerenciamento de resíduos sólidos. Para isso ela enuncia como princípio: a redução do (...) consumo de recursos naturais a um nível, no mínimo, equivalente à capacidade de sustentação estimada do planeta; e o estímulo à adoção de padrões sustentáveis de produção e consumo de bens e serviços.
E como a indústria e o consumo influenciam essa cadeia?
Energia e recursos naturais são crescentemente demandados para a produção de objetos projetados para serem inviabilizados em seu uso prolongado. Pela necessidade de consumo dos objetos produzidos, desenvolveu-se também um complexo sistema de produção de consumidores para os objetos, pela colonização da imaginação. Veja, por exemplo, o sedutor IPad 3 da Apple, deliberadamente projetado para ser substituído e não consertado. Num sistema econômico que produz aceleradamente e crescentemente lixo cada vez mais diversificado, é bom recuperar materiais, mas essa estratégia é insuficiente face à magnitude dos problemas.
Qual o melhor caminho para o êxito da responsabilidade compartilhada na gestão dos resíduos sólidos?
Cidadãos conscientes, proativos, educados e mobilizados para a coleta seletiva. Administração municipal com órgãos gestores de resíduos sólidos qualificados, preferencialmente constituídos na forma de consórcios públicos a implantar o modelo de gestão de resíduos sólidos preconizado pelo MMA (Ministério do Meio Ambiente), e setor empresarial a constituir uma gerenciadora com atuação nacional, semelhante aos Pontos Verdes europeus ou ao INPEV, uma instituição brasileira privada que recupera mais de 90% de todas as embalagens pós consumo de agrotóxicos.
O senhor defende a “bandeira” da reciclagem em oposição à incineração dos resíduos sólidos em sua destinação final. O que falta para o trabalho das cooperativas de reciclagem saltar em qualidade e quantidade?
Não faltam recursos. Não faltam modelos de gestão eficazes e efetivos para a recuperação dos resíduos. Não faltam leis. Faltam órgãos municipais gestores de resíduos sólidos qualificados. A palavra-chave é qualificação. Gente qualificada. Consórcios públicos são um dos caminhos para a superação dessas dificuldades. A discussão que é feita no município de São Paulo, de que a coleta seletiva não deslancha dos pífios 1% de materiais recuperados há mais de vinte anos, em razão dos problemas existentes com cooperativas de catadores, somente revela o quanto esse assunto é pouco compreendido. Ou manipulado. A cidade de Londrina, por exemplo, em cinco anos atingiu a coleta de quase toda a cidade, com mais de 20% de todos os materiais recuperados, num sistema baseado na atuação de catadores. As políticas públicas priorizam com acerto essa categoria por que há uma dívida social a ser paga. Mas há cidades onde não há catadores. Ou cidades onde o número de catadores é insuficiente para atender todas suas necessidades. O catador é um ator importante que não prescinde do apoio da administração municipal, mas não é o único.
Quanto à incineração, o “desaparecimento” dos resíduos e sua transformação em energia elétrica torna essa alternativa uma tentação. Mas sou contrário à sua adoção no país. É preciso lembrar que não há mágica, os resíduos não desaparecem: na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma.
A incineração transforma os mais variados materiais em trilhões de minúsculas partículas, que se combinam entre si e formam novos compostos, que devem ser capturados com os gases e, posteriormente, acondicionados e dispostos de forma ambientalmente adequada. A incineração gera cinzas tóxicas e emissões tóxicas, que nas condições de gestão precárias, apresentam riscos à saúde pública e ao meio ambiente. A incineração provoca despesas públicas imensas comprometidas por décadas; é das alternativas de gestão de resíduos que mais gera gases de efeito estufa e a que mais desperdiça energia; é das alternativas de gestão que menos gera postos de trabalho e que compete com os catadores de materiais recicláveis pelos materiais recicláveis “secos”.
Nossa tarefa no século 21 não é encontrar melhores formas de destruição de materiais descartados, mas parar de fazer embalagens e produtos que têm de ser destruídos. O problema acontece pela mistura de materiais, e deixa de ser problema quando coletado separadamente. Resíduo domiciliar pode ser resolvido pelo uso de baixa tecnologia – compostagem/biodigestão (fração úmida), reciclagem (fração seca).
Tratando do consumidor e a ampliação do volume de material corretamente destinado: quais as melhores alternativas (educação ambiental e conscientização, por exemplo) que os municípios devem utilizar para obter a colaboração da população e mudar hábitos?
Trabalho de “formiguinha”, casa a casa, associado a campanhas permanentes de mobilização para a separação dos resíduos em secos (embalagens, papéis, plásticos, vidros, etc), úmidos(restos de comida e jardins) e rejeitos. Sobre mudanças de hábitos, gosto muito de um ditado popular português: A alegria de uma casa / Em bem pouco se resume / Beijos abraços canções / Água, pão, flores e lume.
Mas para o sistema econômico o que interessa é produção máxima, consumo máximo e o descarte cada vez mais rápido do que foi consumido para que os novos materiais produzidos possam ser consumidos e rapidamente descartados. O ditado desse sistema é: consumo, logo sou feliz. Sabemos que isso é verdade somente até certo ponto.
Daep / Secom – PMP
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