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30/10/2025
A pejotização e o combate aos “fake contracts”: A linha tênue entre a autonomia e a fraude nas relações trabalhistas
A pejotização – a contratação de um profissional como Pessoa Jurídica (PJ) para realizar atividades que, na prática, configuram uma relação de emprego – tornou-se um dos temas mais debatidos e complexos do Direito do Trabalho brasileiro. De um lado, ela é defendida como uma forma de flexibilizar relações de trabalho, fomentar o empreendedorismo e reduzir custos para as empresas. De outro, é amplamente criticada por ser frequentemente utilizada para mascarar vínculos empregatícios, suprimir direitos trabalhistas e, em última instância, configurar uma fraude conhecida como “fake contract”. O Supremo Tribunal Federal (STF) tem desempenhado um papel crucial na definição dos limites dessa prática, buscando equilibrar a liberdade econômica com a proteção social do trabalhador.
A pejotização ganhou força no Brasil impulsionada pela busca por maior flexibilidade nas contratações e pela diminuição da carga tributária e encargos sociais associados aos contratos de trabalho regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Empresas, de diversos setores, passaram a exigir ou incentivar que seus colaboradores abrissem uma empresa (geralmente um MEI ou uma microempresa) para formalizar a prestação de serviços.
Inicialmente, a Justiça do Trabalho, com base nos princípios protetivos do direito trabalhista, tendia a reconhecer o vínculo empregatício sempre que identificava os elementos característicos da relação de emprego (pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e, principalmente, subordinação), independentemente da roupagem formal de PJ. No entanto, a discussão escalou para o STF, que começou a analisar a validade de certas modalidades de contratação de PJ à luz da Constituição Federal, em especial os princípios da livre iniciativa e da valorização do trabalho.
O STF, em uma série de decisões recentes, tem se posicionado no sentido de que a contratação de PJ para a prestação de serviços não é, por si só, ilícita. Contudo, essa premissa vem acompanhada de uma ressalva fundamental: essa modalidade de contratação só será legítima se houver autonomia real do profissional PJ. Quando a contratação como PJ serve apenas para fraudar a legislação trabalhista, configurando um “fake contract”, o vínculo empregatício deve ser reconhecido.
A análise do que configura um “fake contract” passa pela identificação dos quatro elementos essenciais da relação de emprego, previstos no artigo 3º da CLT:
> Pessoalidade: O serviço é prestado por uma pessoa física específica e não pode ser substituída livremente por outra.
> Não Eventualidade: O trabalho é contínuo e integrado à atividade-fim da empresa, não sendo esporádico ou temporário.
> Onerosidade: Há o pagamento de um salário ou remuneração pelos serviços prestados.
> Subordinação: Este é o elemento mais importante e o foco principal da análise do STF. Refere-se à dependência hierárquica, à sujeição do trabalhador às ordens, fiscalização e disciplina do empregador, com controle de jornada, metas e modus operandi.
As decisões do STF sobre pejotização são matizadas. O Tribunal não proíbe a contratação de PJ, mas busca combater o uso fraudulento dessa modalidade. Em julgados como a ADPF 324, a ADI 5.595 e o Tema 725 da Repercussão Geral, que validaram a terceirização e, por extensão, abriram caminho para a prestação de serviços por PJ em algumas atividades-fim das empresas, o STF enfatizou a liberdade de contratar e a livre iniciativa. No entanto, em outras decisões, o STF tem reafirmado que essa liberdade não é absoluta e que a fraude à CLT não será tolerada.
A chave para o STF é a autonomia do profissional. Se o indivíduo, embora formalmente PJ, estiver inserido na estrutura hierárquica da empresa, receber ordens diretas, tiver sua jornada controlada, for punido por não cumprir metas ou tiver sua atividade essencialmente idêntica à de um empregado celetista, a pejotização será considerada fraudulenta. Em resumo, o STF não proíbe a pejotização quando há genuína autonomia e inexistência de subordinação, mas condena veementemente os “fake contracts” que mascaram uma relação de emprego.
Em casos de profissionais de alta especialização ou regulamentados (como advogados, médicos, engenheiros, entre outros), o STF tem tendido a prestigiar a autonomia e a presunção de legalidade da contratação como PJ, desde que não se comprove a subordinação. No entanto, a prova da subordinação pode derrubar essa presunção.
Quando a Justiça do Trabalho, após análise das provas (testemunhos, e-mails, controle de acesso, metas etc.), identifica que a contratação como PJ mascarava uma relação de emprego, o resultado é o reconhecimento do vínculo empregatício. Isso implica que a empresa é condenada a pagar todos os direitos trabalhistas que foram sonegados, como férias, 13º salário, FGTS, horas extras, verbas rescisórias, além de multas e encargos sociais. A decisão tem um impacto financeiro significativo para a empresa e representa a restauração dos direitos do trabalhador.
O cenário atual da pejotização no Brasil é de busca por um equilíbrio delicado. O STF reconhece a validade da contratação de Pessoa Jurídica como um instrumento legítimo de organização do trabalho, mas com a condição inegociável de que haja autonomia real do prestador de serviços.
Para empresas e profissionais, a mensagem é clara: a pejotização é uma opção válida para quem busca flexibilidade e empreendedorismo genuíno. No entanto, o uso dessa modalidade para criar “fake contracts” – ou seja, disfarçar uma relação de emprego sob o manto de um contrato de PJ para suprimir direitos – é uma fraude que continua a ser combatida vigorosamente pelo Poder Judiciário, com o respaldo da Suprema Corte. A chave para a licitude está na ausência de subordinação. A transparência, a autonomia na prestação dos serviços e a observância rigorosa da legislação são fundamentais para evitar litígios e garantir a segurança jurídica de todos os envolvidos. O combate aos “fake contracts” é uma prioridade para garantir que a flexibilidade não se transforme em precarização.
No caso de dúvidas sobre políticas internas, direitos trabalhistas ou condutas no trabalho, consulte sempre um advogado de sua confiança para garantir a melhor orientação e evitar complicações legais.
(*) Luis Fernando de Castro. OAB/SP 156.342. Especialista contencioso civil e trabalhista, parceiro da Advocacia Eduardo. Queiroz - Araçatuba/SP. E-mail: lc@luiscastro.adv.br / Fone: (18) 3424-8121. Whats: (18) 99749-4554
Luis F. de Castro (*)
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